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Castelos de Areia e Sonhos

Castelos de Areia na praia

Sonhos

Toda criança constrói seus sonhos, independente de quão sólidos eles são ou não. Não é isso que as motiva.

Sólidos ou frágeis, realidade ou fantasia, perenes ou efêmeros, ao brincar à beira mar juntando um monte de areia molhada as crianças erguem seus sonhos e vivem, ainda que por momentos, suas fantasias.

Todos nós, bregas ou não, vivemos isso… alguns de nós assumem isso, outros negam, mas quase todos nós em algum momento erguemos lá nossos castelos, tenham eles a ver com mergulho, ou não. Eu, particularmente, brega assumido que sou, viajei muito nessas areias.

Parei com essa besteira por um grande tempo, até que o desafio de brincar com um filho na praia me devolveu, como devolve muitos pais, a essa viagem.

Mas o Matheus cresceu, e se hoje eu falar para seus amigos e namorada dos castelos que fazíamos à beira-mar, ele vai ser zoado por dias. Assim é a vida.
A vida é legal. A gente só precisa entendê-la, e isso não é tão fácil.

México

A cada ano, e lá se vão muitos deles, eu volto aqui para o México para dar uma vazão especial a duas paixões: mergulhar em cavernas, e ensinar, ou ao menos tentar, as pessoas a fazerem isso.

Não necessariamente nessa ordem, tenho que assumir, para desespero dos meus lanternados alunos… adoro ensinar. Nem sei se consigo fazer isso, mas tenho absoluta paixão por vê-los aprender. Seja por mim, sem mim ou apesar de mim, vê-los evoluir rouba o meu fôlego… sei lá. Sou assim.

Mergulho em Nai Tucha, no México

Há muitos anos venho aqui e escrevo textos enormes, na vã esperança de tentar passar para quem não está aqui, o quê é isso aqui. Não consigo, claro, mas eles (os alunos) acabam vindo para cá, ver por si próprios, felizmente.

Acho que fazem isso para eu ver se paro de escrever… mas, sou teimoso, abnegado, sempre disse D. Marli. É… eu sou assim, teimoso… Um pouco.

Há alguns anos, quando escrevi esse texto, vim para cá sem alunos, o que é diferente e raro. Isso me deu liberdade para revisitar e conhecer cavernas absolutamente incríveis, mas falo delas depois… Fato é que agora, em 2.024, voltei a essa caverna e ela, com alunos de novo, desenterrou esse texto esquecido… Azar de vocês, que agora estão lendo mais um texto, que eu havia prometido parar de publicar.

Aquele era para ser, até certo ponto, um ano despretensioso em inspiração, mas isso durou logo 2 mergulhos.

O mergulho em Nai Tucha

Foi uma caverna que visitei várias e várias vezes nesses anos todos. Praticamente sem novidades…
Mas, nessa vida, novidades estão muito mais em nossos corações e mentes do que em pedras e água.

Já escrevi várias vezes sobre a predileção que nós, mergulhadores de cavernas, temos pelas passagens apertadas, pelo desafio, a adrenalina de passarmos por lugares que, ao olharmos, duvidamos que conseguiremos atravessar. É estranho, talvez insano, mas isso nos motiva e nos apaixona, e prometo contar sobre essas no futuro. É estranho, assumo… mas, somos assim, todos nós, mergulhadores.

Ai veio essa caverna… oposta a tudo o que gostamos (ou gosto, pelo menos). Enorme, larga, alta, sem desafio nenhum se é que podemos chamar de nadar centenas e centenas de metros para dentro da terra como algo ‘sem desafios’…

E então, em mais uma das viagens que eu não espero que ninguém entenda, vieram os castelos de areia.
Eu nunca fui bom em fazer castelos de areia. Qualquer um que me conheça sabe que eu tenho duas mãos esquerdas para qualquer atividade manual, o que não seria um problema se eu fosse canhoto. Não sou.

Nessa linha, quando o Matheus era pequeno, e era minha missão erguer os castelos de areia, a minha escolha natural não eram os castelos de areia seca, ratinhos, simétricos… eu até queria, mas a falta de habilidade me fazia construir aqueles à beira mar, deixando a areia molhada escorrer pelos dedos e formando imagens meio góticas, que na minha ilusão eu imaginava entreter meu filho.

Ele, após meia hora daquela bizarrice fugia, enjoado, para atividades mais recompeadoras, como jogar bola, tomar sorvete ou socializar com as crianças dos guarda-sois vizinhos. Muito mais esperto ele do que eu.

Mas ali, em uma caverna com o fundo preenchido por uma areia escura como a das praias que eu frequentava, navegando entre dezenas de formações que me lembraram, imediatamente, as formações de areia que eu fazia, e todos vocês já fizeram e, se não tem filhos ainda, irão fazer um dia. Acreditem… esses serão vocês, amanhã.

A caverna, grande como muitos de nós não gostamos, mexeu comigo. Talvez tenham sido os salões enormes, com talvez 40 metros ou mais de largura, cujos limites minha lanterna não conseguia iluminar. Talvez tenha sido o pé direito, seguramente perto de dez metros, permitindo que nós brincássemos de astronautas, como sempre digo e escrevo.

Talvez fossem as formações, com camadas e camadas de pedra calcária caindo umas sobre as outras, como aquelas torres de chocolate líquido nas lojas dos Shoppings, como que em uma imitação melhorada e aumentada dos meus castelos. Bem melhorada, diga-se. Mas, penso que não foi só isso…

Me lembrei de todas as vezes que naveguei por ali, apagado, a fim de não atrapalhar os alunos, vendo-os flutuar por entre torres e torres de castelos de areia, e percebi que havia algo mais mexendo comigo.

Os alunos: Sempre eles

Demorei uma meia hora para entender o óbvio… Castelos de areia são bem legais, é verdade, mas aquilo que os erguem é muito mais importante.

Ali, lembrando dos meus alunos voando por entre as paredes e formações daquele castelo gigantesco, como formiguinhas, pensei em sonhos, em fantasia, em superação e, sendo eu, claro, em paixão. Sempre fui apaixonado.

Hoje, sou apaixonado por esse lance de tentar apaixonar as pessoas.

Apaixoná-las por se superarem, por evoluírem, vencerem barreiras, ir além do que estão acostumadas a fazer. Não consigo nada disso, claro, não tenho essa condição, mas eu disse que sou apaixonado por TENTAR apaixoná-las. Sou bem chato nisso, alias. Como já disse, esse sou eu.

E, ali, eram eles. Seja por minha culpa ou não, eles estavam ali, flutuando entre os castelos de areia de uma das minhas duas infâncias… quem não tem filho ainda, um dia entenderá isso.

Ali, misturando minha viagem e a conquista de pessoas se superando, tudo na mesma cena, entendi que sou privilegiado. Seja pela audácia do tio Lalo que resolveu acreditar em mim, seja pela confiança dos meus alunos, o quê não canso de dizer que é o maior tesouro que já conquistei, sou abençoado por poder fazer o que faço e ver o que vejo.

Assim como no caso dos castelos, vejo meus sonhos tomarem forma e acontecerem. Diferente dos meus sonhos, as conquistas dessas pessoas não é Ilusória, efêmera.

Em meus castelos eu criava mundos paralelos, existentes em minha imaginação. Aqui no México, nessas cavernas, a viagem é real… quem veio aqui mergulhar, aprende isso. Aqui, tudo é possível, se você pensar, sonhar, trabalhar bastante.

Sonhando com o futuro

Aqui eu me imaginei, em alguns anos, guiando meu filho. Aqui eu me imaginei trazendo ele para dentro do meu mundo, da minha imaginação, dos meus sonhos. Aqui, naquele mergulho, eu o imaginei flutuando à minha frente, embasbacado com tudo o quê um dia ele verá, porque ele verá um dia, como todos os que veem se embasbacam.

Eu sempre vim, vi, e escrevi… Sempre fiz isso pensando em explicar para alguém que não estava aqui, o quê eu estava vivendo…

Aqui, naquele dia, eu vi meu filho, nos meus alunos que já estiveram aqui. E ele não saberá disso quando estiver aqui, como meus alunos não sabem que os vejo assim. Por que a nossa viagem, os nossos sonhos e nossos castelos são, em suma, nossos e de mais ninguém.

Um dia, na praia, do alto da sua sabedoria de três ou quatro anos de vida, após horas construindo um castelo enorme o Matheus me perguntou:

– “Pai… por quê o mar derruba o que a gente faz?”
– “Na verdade, filho, ele está só arrumando o quê a gente bagunçou. “, respondi, como um mestre Shaolin de araque.

Depois que eu o levar para mergulhar nessas cavernas, ele saberá a resposta que deverá dar para o seu filho:

– “A gente constrói aqui o quê, um dia, você verá embaixo da terra, onde o mar não derruba.”

Por que o mar é poderoso, mas não é mais forte do que nossos sonhos.

Um dia eu verei ele ali, autossuficiente, preparando e checando seu equipamento melhor do que eu próprio chequei o meu, discutindo o planejamento com seus amigos, vencendo desafios, se superando, flutuando entre torres de areia, negociando restrições, guiando mergulhos, e entrando em lugares que eu mesmo não irei entrar.

Ele não precisará fazer nada disso, óbvio, para ter o meu respeito e meu amor incondicional, se não quiser.

Mas eu acho que fará.

Eu acho que fará porque, se eu não sou bom em fazer o que faço, e aceito isso numa boa, em uma coisa, eu acho que sou: Sou bom em apaixonar as pessoas por sonhos.

E é fácil explicar o porquê disso…

São os castelos de areia, sabem!

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