Hoje tive a certeza de que Julio Verne era mergulhador de cavernas… 🙂

E revivi na memória, uma vez mais, as leituras das aventuras do Prof. Lindenbrook e sua trupe em direção ao Centro da Terra.
Já escrevi isso em um outro ano, mas ao assistir ao desenho “Viagem ao Centro da Terra” durante a minha infância (aliás muito melhor do que essas porcarias de Ben 10 e outras tralhas que fazem sucesso hoje), sempre ficava imaginando como poderiam existir espaços abertos tão grandes como aqueles ali retratados embaixo da terra.
Vir aqui para o México e mergulhar nestas cavernas as vezes te deixa com dúvidas sobre onde termina a ficção e começa a realidade.
Programamos para hoje, 5a feira, um mergulho profundo em uma caverna fantástica aqui. Digo “caverna fantástica” porque, embora quase todas sejam fantásticas ao seu modo, esta em particular consegue embasbacar a todos que por ela passam.
Mergulho no Poço

“The Pit“, ou “O Poço” lembra exatamente isso. Um buraco encravado em meio a selva mexicana, pouco maior do que o do tamanho de uma quadra de futsal, reserva para os visitantes uma beleza cênica memorável. O nível de água fica vários metros para baixo do nível do solo, e a luz do sol entrando pelo buraco lança fachos verticais em direção ao fundo do poço dignos de uma cena de cinema.
Dentro da água atravessamos essa ‘Cortina de Luz’, brincando com as formas. Abaixo de nós a profundidade da caverna parece nos chamar. Os mergulhadores à minha frente, somem através da haloclina, lá pelos 25 metros de profundidade. Além dessa linha tênue, água salgada. Atravesso a barreira que separa as camadas de água com densidades diferentes, e tudo volta a ficar nítido.
Confiro atrás de mim, e vejo os demais do time de cinco mergulhadores atravessando a camada também. 25 metros de profundidade, 30, 35…

Estamos agora abaixo da camada de sulfeto de hidrogênio permanente que existe no fundo do poço, neste mergulho agradavelmente suave. Essa camada, fruto da decomposição do material orgânico no fundo do poço principal composto por raízes, troncos e folhas ali caídos, empresta um ar surreal àquela parte da caverna. É como uma nuvem esverdeada, permanentemente repousando na divisa entre as camadas de água doce e salgada. Atravessá-la é como mudar de mundos.
A caverna começa a ficar um pouco mais escura, a medida que saímos da zona de luz direta e nos embrenhamos para dentro do túnel. Chama a minha atenção as dimensões dessa garganta enorme. Penetramos em um conduto que deve medir, seguramente, uns 20 metros de largura por muitos de altura. O computador indica agora 45 metros
Passamos do nosso cabo de águas abertas para o cabo permanente da caverna, e seguimos descendo. 48 metros, 50… Á água dá uma esfriada, e automaticamente procuro a válvula no peito para injetar ar na roupa seca, esquecendo completamente que aqui no México isso não é necessário. Raro para nós mergulhar a essa profundidade sem usar roupa seca. Mas isso aqui é um paraíso, então seguimos mais para baixo e mais para dentro da caverna.
Viagem ao Centro da Terra
O túnel que agora exploramos parece ficar ainda maior. Aos 50 metros de profundidade aponto a lanterna para as paredes e mal consigo enxergá-las. O conduto é enorme. A suave luz azulada que nos envolvia fica para trás agora, nos limites do poço principal, e enquanto vamos entrando mais no túnel passamos a depender exclusivamente das lanternas. A garganta segue, monumental, terra a dentro.
Procuro o teto do conduto, para referência. Aponto a lanterna para cima e igualmente não vejo pedra. O túnel segue inclinado para baixo, e nós seguimos descendo: 55 metros… 58… paramos a descida aos 60 metros, fiéis ao nosso planejamento. Dava para descer mais vários metros, fácil. O time todo entretanto respeita o combinado e seguimos navegando mais para dentro, sobrevoando o cabo no fundo, mantendo os 60 metros planejados.
Volto a apontar a lanterna buscando paredes como referência, e consigo divisa-las bem distante da nossa linha de mergulhadores, tanto à esquerda como a nossa direita. O túnel é realmente enorme. Olho para frente e a luz da lanterna some, sem encontrar um obstáculo para se refletir.

Imagino nessa hora que se me aproximar da parede, a exemplo do livro do Julio Verne ou do desenho da minha infância, vou encontrar as letras “A.S.” (de Arne Saknussem, o explorador perdido cujos passos o Prof. Lindenbrook segue, na estória).
A Atlântida (objetivo que na estória o Prof. e seus amigos buscam) tenho certeza de que não encontraremos, mas que fica a sensação de que estávamos rumando em direção ao Centro da Terra, isso ficou.
Um pouco antes do limite de tempo programado sinalizamos para retornarmos. Seguindo um roteiro minuciosamente programado, retornamos ao nosso cabo e iniciamos a subida e as paradas de deco absolutamente dentro do combinado.
Show de luzes embaixo da água
Durante toda a fase de Deco ficamos apreciando o transito de mergulhadores que iam e vinham, dos mais diferentes níveis de experiência, curtindo a parte aberta do “Poço” e brincando nas cortinas de luz vivas, apreciando o cenário.
60 metros de profundidade, 20 minutos de fundo, mais do que o dobro disso para poder sair da água, e a certeza de que essa terra tem realmente encantos mil para te fascinar, cativar e, seguramente, viciar.
Como eu sempre repito, tem que vir aqui conhecer e ver.
Sei que é difícil conseguir explicar o que é a dimensão desse lugar. Eu tento com palavras. Nosso amigo Cristian Dimitrius faz isso muito melhor, com suas imagens maravilhosas.
Abaixo outra pintura de foto dele, mostrando mergulhadores ainda na parte aberta do Pit.
Esse lugar é mágico.
